quinta-feira, fevereiro 17, 2005

Canção do amor e da ira calada


Que a melancolia
não me leve a sombra
de árvore viva
em alma de primavera

Que não oiça
a maré alta que soa...
Quero ficar quieta
a sonhá-la, da duna...

Que a duna do meu peito
permaneça adormecida
que não a toque a chama
nem a ventania

Que os meus olhos ousem
uma vez na vida
olhar o sol de frente
e depois fique cega

E cega, deixarei passar sem ver
toda a lonjura onde não fui nem irei
todo o ouro, todo o azul.

E, ainda que não vendo,
vereis vós dos meus tormentos
fazerem-se vulcões meus olhos
que foram ensombrados lagos

Deixai-me ficar quieta
no meu terraço florido
com meus pássaros cantando

Levai o vosso sossego
do meu ser angustiado

Que o sol me seque o pranto
e o ar o leve escondido...
Horas Amargas



na hora
em que
te abates
sobre o teu próprio
silêncio
em que
te sobra tanto
tempo
e espaço
em que
te sobra
tanto quanto
precisas
entendimento


na hora
em que
contas
pela ausência
de uma mão
sobre a tua
quantos
amigos te restam
de quantos
te prometiam
consolo
no tempo do sorriso

na hora
em que
te debruças
sobre o teu próprio
abismo
de amargura

nessa hora
saberás
a fundura
da tua
pequena grandeza!




13/11/2002
... Depois


É forçoso caminhar
Além do precário ser
Do ignorado existir
No tempo e modo
Devir

Depois é preciso sonhar
É difícil construir
....Depois

A estrela longe a fulgir
Tanto se pode alcançar
Quanto se pode perder

....Depois
Será preciso tentar
Redesenhar o amor

15/2/2004
Diz que é meu engano a desdita!



Nos meus olhos desertos
da tua presença
e
foscos de tanta tristeza
na
eterna lua-nova
cerrada e ansiosa
...
separa
o mordente sal
da água
diz apenas uma palavra
sopra uma vez que seja
que estás comigo ainda
que é meu engano a desdita
de jazer abandonada
e faz crescer a esperança
e faze de lua-cheia
o colo que te aninhava
e
anseia
reflorir em esplendorosa
e infinita aliança
o meu destino
de areia!

Lisboa, 14/10/2004
Do cálido Beijo


Levito
Na brisa

Fluo no azul
Diáfano

Excedendo
O além de

Botão abrindo

No âmago,

A vida
Transluz

Fulgurante
Florida

Reacendo
A vida.
Eu e Tu


Os nossos sonhos e planos
Com desvelo entrelaçamos
Tu e eu somos um todo
O mundo reinventamos!
As mãos tremendo




De repente,

As mãos encontram-se

Tremendo sozinhas

No meio da noite

Quase podendo tocar-te

Tremendo

Por desejar-te

Mas tu estás tão ausente

Se bem estejas tão presente!

E o espaço se faz imenso

Volteia no ar minha chama

No teu encalço

... Mas não te alcanço!

Escuta o coração lancinante

Dizer-te secretamente

Vem, meigo e doce

Fazer-me vibrar

Fremente

Corda de violino nos teus braços;

Sê o arco que me faz gemer

De prazer

E gritar delirante


As palmas das minhas mãos

Dão por si tão de repente

Vazias de ti,

Tremendo

Antecipando o instante....


5/3/2004
Proposta


No mais perfeito compasso

Claramente de mão dada

Mesmo em hora de cansaço

Venceremos a jornada
Gostavas de ser diferente?



Se tu fosses diferente
Do Homem que és agora
Verias, crendo sómente,
Já que atento e consciente,
Que quando a alma acorda
Da dor, eterna cadeia,
O nosso olhar se alteia
Vendo mais à nossa volta


Tanta coisa ora alheia:
Que adormecida paira!


Que tudo o que se cria
Não morre mas se transforma!

Que onde estiver Deus cuida
Atento, da sua obra!

Que é dentro do sofrimento
Que a consciência acorda!

Que o amor que se semeia
Há-de reflorir ainda!


Se tu fosses diferente
Quem sabe alguém veria


Que é na palavra fluente
Do que ousa pensar diferente
Que a mudança principia!



Lisboa, 22/6/2002
Tu sabes lá...




O que é ser-se
uma mulher solitária!
Ter tanta coisa a dizer
e ninguém para escutar!
O corpo e a alma a tremer
e ninguém nos encontrar!
Andar às cegas na luz
e ver bem na escuridão!
Até um olhar se agradece,
até nos enleva um sorriso!
Não é a solidão que dói,
que a solidão não existe!
É bom falar com si mesma,
a solidão não é triste!


É um vazio qualquer,
uma cadeira a sobrar,
uma ânsia de pedir
com vergonha de aceitar!
"Quem desdenha..."


...E te darei o meu beijo,

Me dizes meio sorrindo!

Não te atiçasse o desejo,

Porque estarias dizendo?!
Em Esperança


Nos braços da poesia

onde folha a folha teço

um amanhecer de esperança

na Terra em que padeço
Espírito



Dei passos no vazio
Defrontando o abismo
Valeu-me ver-te, brilhante,
Na beira da frágua
Se assim não fosse
Por me achar voando sem asas
Navegando sem leme nem remos
Perderia o tino
E o meu ser
Estilhar-se-ia no fundo
Com um sonido
Dilúcido


Lisboa, 20/9/2004
Canto de Outono







Arrebatados os cachos

As videiras condoídas

Agitam no ar valdevinos

Os braços desadornados

Esbulhadas melenas ruivas

Estremecem despenteadas

Longos dedos desprovidos

Secos de anéis e enliços

Fecham as queimadas parras

E as lágrimas decaem louras

Cobrindo os regos lidados.



Lisboa, 23/9/2004
Horizonte


Sobre a visão da ponte

funde-se o Tejo no mar

é tão lindo o horizonte

onde me perco a sonhar!
Ferida que arde sem doer



Que por teus beijos padece

Que à mingua me consome

De teu corpo tenho sede

De teus beijos tenho fome
De onde mana o alento

Que nos iguala na vida?

Nem tu és o meu cativo

Nem eu sou tua senhora!
Que o vento me levante


Docemente
me eleve
acima de toda a pena
na sua diáfana
asa
proteja
da dor salgada
entranhe
no azul profundo
leve
as cinzas magoadas
na busca
de nuvens brancas
onde
repouse a fronte
a alma repare
adormeça e acorde
sossegue
de onde volte
renascida
para
cantar a ternura
e
saudar a primavera
a
luz que a todos afaga
espargindo
amor na terra

Lisboa, 31/4/2004
ENCONTRO



O MEU CORAÇÃO NO IMO
DO TEU CORAÇÃO

COMO SE O TEMPO E O ESPAÇO PARASSEM


NUM TERNO ENLAÇO
NA DOÇURA DESTE ABRAÇO



LISBOA, 31/4/2004
Sonhadora



Não, não sei como falar-te

Desta alma sonhadora

Que olhando o céu desenha

Uma paisagem colorida

Entre as nuvens imagina

Um mundo que se desdobra

Paralelo a este outro

Donde minha alma se evola



Sou a eterna criança

Brincando à beira da praia

Vou desenhando na areia

Versos que o mar de repente

Desfaz e refaz em espuma



Mas sorrio, não me importo

Fico na margem tranquila

Vendo a areia que rola

E o meu sonho recomeça

Erguendo castelos de espera

Em minha alma, sonhadora.




Lisboa, 5/12/2003

quarta-feira, fevereiro 02, 2005

Nada demora na vida


A brancura da poesia
Esvoaça ao rés da espuma
Beija a praia gota a gota
Como se dedos de céu
Detendo do mar a fúria
Estremece longe a safira
Ergue-se em alta montanha
Que logo decai desfeita
Nada demora na vida
Por muito alto que suba
Por muita força que tenha
Recorda o mar à poeta

terça-feira, fevereiro 01, 2005