segunda-feira, maio 10, 2004

Quando sonho contigo

sou tão feliz que flutuo

e me evado

Sinto-me no apertado

abraço

que recordo

que revivo



sonhando contigo

o mundo fica mais belo

esqueço tudo

e me entrego

aguardando

o momento



de concretizar esse sonho!



Um beijo do Tejo


Enquanto no azul divago
O céu funde-se com o Tejo
onde os barcos se aconchegam

eu sinto-me como um pássaro
afeito à travessia
nestas rotas que te abraçam

A nossa alma ultrapassa
toda e qualquer distância
sem sequer dar conta dela

enquanto os olhos viajam
neste coração o fado
vai trinando de saudade

acostumado à tristeza
que se enlaça na alegria
com que se faz a amizade

Quem Sou?

Sou a viva chama
No vento que voa
Evocando a Vida!
 
De novo sou  flama
Viva como vela
De acesa chama.
 
Na vida que apela
Mantenho-me viva
 
Pirata, que trazes teias
De sedas e de brocados.
Derrubas minhas ameias
Sonho volúpia, delicias

Astuto que me adivinhas
Arrebatas, desatinas
O sangue de minhas veias
Agitas quando caminhas

Nas redes de azuis safiras
Rendadas de espumas brancas
Que ladeiam tuas praias
Vêm assaltar as minhas

Ai noite, tu que vigias
Muda a rota das estrelas
Cruzeiro do Sul tão longe
E a Estrela Polar sozinha

A frialdade arrepia
Pois que lânguida divaga
Mas é tão longe essa Ilha!
Mater Dolorosa




Minh’alma traja de lírios
Sou a Madre trespassada
Por flechas memoriais sinos


Que ecoam na tarde roxa
Ao rematar minha vida

De intrépida luta, tanta!

Eleva-se a ofensa erguida
Como bandeira rasgada

Sobre a terra conquistada
No fragor de uma batalha
Por uma grei esquecida.

No inescrutável espanto.

Maria de todas as dores
Desponta em meu peito o soluço
Que abafaste no teu pranto!

"Crepúsculos"



Na cúpula
De azul cobalto
A andorinha se afasta

No infinito bordado
De vermelho e dourado
O alvo cisne regressa
Brilha o esplêndido manto!

Divago no céu dos Andes
Picos de onde aos céus
Se levantam os condores
Transportando pelos ares
Mensagens de outros mundos
Seguindo o rumo dos astros
Aspiro o ar das florestas!
Argentina de ouro e prata
Tem cautela que os abutres
Estão preparando as garras
Para devorar-te as entranhas
Tais escorpiões e aranhas
Que tudo vão dissolvendo
Com seus palpes e veneno
Proclamam justos temores
Os filhos do sol pensadores
Anseio ver-te em progresso
Sem estragarem o teu manto!

Do ventre da vida



Ondas que se esbatem
Na areia dourada
Nas rochas cinzentas
De franjas cobertas

Escuto e oiço o grito
Dos Homens lutando
Por nada morrendo
O mar traz no dorso
O sangue esvaído
Enterra esqueletos
De homens, mulheres,
Velhos e crianças
A eito apanhados
Em guerras estultas
De lágrimas tantas
Ventre de esperança
Aonde se adoça
Continua a vida


Oh que vontade de correr pelas ruas frias
Neste Natal escuro de guerra e de morte
E procurar por debaixo das pedras
Aquela estrela branca que iluminou os Magos!
Oh que vontade de correr pelas terras nuas
E de chamar a cada Homem irmão
E de abraçar cada criança triste
E destroçar os brinquedos de guerra
E trocá-los por amor e paz e pão
E alumia-lhes os olhos e o peito e os lábios
De esperanças e de sorrisos!
Era uma casa deserta
Sem cortinas na janela
Voando ao sabor da brisa
Onde havia uma menina

Pequena, vivendo de ânsia
Olhos postos no infindo
Sonho feito de estrelados
Céus de amor e de bonança

Desenhava a sua alma
Com as cores da fantasia
E a sua alma abrangia
Todas as cores da esperança

Segue meu fado na bruma
Atento à longa distância
Onde o luzeiro se apaga




E tanto brilhou um dia
A luz alta da esperança
Que hoje não é mais nada
Que uma fugida lembrança


Que em lástima me aniquila

A Mãe no palco da guerra



Ser a mãe correndo cega
Aos zigues zagues na rua
Apertando ao peito ainda
A criança assassinada
Por uma bala perdida

Sobre o solo que trepida
Ver a casa devastada
Algures seu homem erra
Na insânia de uma guerra
Que a todos nos desespera

Jazem os mortos na estrada
Olhos cheios de surpresa
E o sangue empapa a areia
Nesta vastidão deserta
Que a cobiça incendeia
Onde o ódio se apregoa

Rebolando-se nos leitos
Soam mais alto que os tiros
De outras mulheres os gritos
Lançando ao mundo seus filhos
Já antevendo os destinos
De seus meninos amados


Os velhos abandonados
Puseram de lado o espanto
Sofreram e viram tanto
Que o seu momento esperam
No recanto onde se albergam
A morte não temem, esperam!
PARIS

Autor: Nilton Bustamante

trad.p/ francês, Maria Petronilho



Eu que nunca fui a Paris, tenho saudades.
Moi, que ne suis jamais allé à Paris, j’en ai de la nostalgie.

Eu que nunca beijei seus lábios, tenho saudades.
Moi, que n’ai jamais embrassé ses lévres, j’en ai de la nostalgie.
Eu que nunca soube das cores de seu mundo, tenho
Moi, que n’ai pas connu les couleurs de son mond, j’en ai de la nostalgie.
saudades.


Juro que te vi, andamos pelas mesmas alamedas,
Je jure que je t’ai vu, nous nous sommes promenés par les mêmes boulevards,
Sentamo-nos nos mesmos cafés, junto aos poetas.
Nous nous somes assis même aux cafés, parmi les poétes.
Dias ensolarados, o nada prazeroso para fazer...
Des jours ensoleillés, le plaisir de laisser faire laisser passer…


O corpo pedindo,
Le corps demandant
Os olhos vendo através dos pensamentos,
Les yeus voyant tranvers la pensée
A vontade de ser feliz, Paris, Paris...
La volonté d’être heureux, Paris, Paris…


Vem pra mim, eu que nunca fui a Paris,
Viens à moi, que je ne suis jamais allé á Paris,
Vem pra mim, eu que sempre te quis.
Viens à moi, parce que je t’ai aimé toujours.
Paris, Paris, meu estado de espírito.
Paris, Paris, mon état d’esprit.


Nas Tuas entrego a minha angústia e a minha paz
Nas Tuas mãos nascem as noites e as manhãs
Nas Tuas mãos se levantam os ventos e se acalmam tempestades

A Ti o princípio e o fim e o reverso.

Infinito ciclo

Tu és Tudo!

Faço-me ânsia!
Minhas centelhas
Tomam formas
Percorrem distâncias
envolvem-te alucinadas

Divago no céu,
Em demandas
Os olhos acesos
De urgências.
As mãos implorando
As tuas

Entranho-me em teus sonhos
E sussurro aos teu ouvidos
Cânticos infinitos, pois

Nasci entre os astros
E venho tomar-te nos braços
Para cingidos subirmos
À luz onde pertencemos

E meu amor que não vem!


A imersão balsâmica
De alfazema e de rosa
Há tanto te aguarda!
Criei afrodisíacos aromas
Para refazer-nos à ceia

Alongam-se meus olhos
Na estrada vazia
Inflamo-me sonhadora
Antecipando a centelha
De teu corpo que ao rasar-me
Chispa minha rubra brasa
E me leva incendiada
Numa ânsia indefinida
De onde assomo renascida

Aonde estás, que te detém?
Escuta bramir o silêncio
Segue-o e vem!

Despe-me das sedas diáfanas
Que aprisionam a ninfa ansiosa
Pelo golpe da tua asa
Afim de achar-se libertada

Tudo se aquieta na tarde calma
O sol declina levando a esperança
De retirar-me contigo
Em arrebatador desvario
E anoitecer nos teus braços
Em langorosa bonança....
CÁLIZ INGRATO
Cálice ingrato
Autor Alberto Peyrano; trad p/ português Maria Petronilho


Y se hace vieja la calle...
Já se faz velha a rua....
Tan vieja y agobiada,
Tão velha e angustiada
depositada en esos ojos nuevos
confiada nesses olhos novos
que nacieron en un país que duerme ,
que nasceram num país que dorme,
donde la mañana sólo sirve para nada...
onde a manhã para nada serve....


Existe un árbol donde un pájaro
Existe uma árvore onde um pássaro
renunció a su canto cierta noche,
renunciou a seu canto certa noite,
y le contó al poeta
e confidenciou ao poeta
la negra pesadilla que observó
a negra inquietação que percebeu
bajo sus ramas,
sob as suas ramas
tal vez para llorar con él
talvez para chorar com ele
o para buscar apoyo
ou para buscar apoio
en los gritos del verso
nos gritos do verso
que la angustia inspira,
que a angústia inspira
con la esperanza anticipada y casi vana
com a esperança antecipada e quase vã
de un poeta escuchado y atendido
de um poeta escutado e acatado
en medio del vacío.
no meio do vazio.


Se le va el aliento al futuro,
Vai-se com alento no futuro
ensayando a tientas la sobrevivencia,
ensaiando às tentativas a sobrevivência

nadando entre los vómitos inéditos
nadando entre os vómitos inéditos
que son lanzados en diarios y cartones,
que são lançados em diários e panfletos
y que se tragan en el plato de comida
e que se tragam no prato de comida
que tiene gusto a rabia
que tem gosto de raiva
y a resentimiento.
E de ressentimento


Es un cáliz ingrato el que ofreces,
É um cálice ingrato o que ofereces
mi ciudad, a tus hijos y al presente,
minha cidade, aos teus filhos e ao presente
que hace pensar en un solar
que faz pensar numa linhagem
ausente
ausente
o desaparecido,
ou desaparecida
vacío de esperanzas, protección o abrigo
vazia de esperanças, protecção e abrigo
y donde no se pueden
e onde não se podem
ensayar pasos hacia el frente.

Ensaiar passos avante


Tu presente profano, ciudad,
O teu presente profano, cidade,
cachetea muy duro y sin piedad
esbofeteia com muita dureza e sem piedade
a mi futuro,
o meu futuro,
a mi no-ser que clama
o meu não-ser que clama
porque apartes este cáliz
para que afastes este cálice
donde el poema
onde o poema
quedó disuelto en lágrimas
se desfez em lágrimas
junto al pájaro inerte
junto ao pássaro inerte
que se volvió al olvido.

Que retornou para o esquecimento.



Alberto Peyrano
Buenos Aires, Abril 2004


Ah, feliz da musa, da vénus, da sereia
Que te retira da tua Ilha sombria
Onde te debruças para felicidade nossa
Mas no teu próprio desterro
Desfiando colares e colares
De versos feitos de pérolas caídas
Dos teus olhos húmidos de ânsia!
Feliz da musa, da vénus, da sereia
Que encantadoramente cantas
Queira estar em afectiva atalaia
Pois é diamantina a tua voz
Que reluz engastada e nos ilumina
As almas encolhidas no proclamado
Mas dolorido ouro do silêncio!
A Um Futuro de Ordem e Progresso

Maria Petronilho

Brasil, venho de lá do mar
Com os braços carregados de flores e de esperança,
Que é primavera, e é Abril!
Chego com o coração florido de alegria
Desde o cais das Descobertas.

Trago na alma as dores cicatrizadas
De agruras e espoliações
Dos lusitanos de antanho,
Sedentos de pedras e preciosidades
Mas disponho o coração dulcificado
Por mor de diamantes fraternos,
Que valem mais do que pesam
Não se vendem nem compram,
Crescem com a seiva que emana
Da nossa compreensão

Quinhentos e quatro anos de luta
São cansativos mesmo para um jovem
Que contém no seu âmago a força
De todas as cores entrelaçadas
Em sorrisos profusos como as folhas dos mangais

Sobre rios de águas povoadas de golfinhos brancos
E de sucuris e de piranhas no aguardo,
Mudando de nome conforme os tempos vão mudando
E os senhores dos impérios que todos servimos
Pois nem todo o sangue e suor do esforço colectivo
Chegam para saciar-lhes a fome de manter-nos angustiados.

Continuam armando arapucas sem fim
Nessas terras infindáveis onde a morte
Marca passo nas ruas onde o samba escamba no eterno carnaval
Os esquadrões da morte andam armados de agulhas
E o império continua dividindo as riquezas
Deixando os teus filhos nos labirintos das favelas
Suspensas em ladeiras tão altas
Para onde mais fácil é subir do que descer

Quinhentos e quatro anos de labor contra a cobiça
Na fome feita de abastança roubada
É tarefa só possível aos grandes heróis
Aos homens sem terra no maior país do mundo

Que breve surja o dia, pátria dos meus irmãos
Em que os senhores do costume desçam dos capitéis de ouro
E seja possível à sonhadora da barra do Tejo
Seguir enfim o rumo aberto em luminosidades azuis
Para ir ter contigo... sinal que a riqueza do mundo
A deixou enfim fretar um banco na classe económica
Aonde transporte os ossos calcinados e os olhos deslumbrados
De uma vida inteira de abnegação
Por um pequeno país em decréscimo de tudo
Menos de arrogância e de hipocrisia de um poder fictício

Peço a Deus a honra de abraçar em glória
O Brasil que mais merece do que tem:
Sereno bem estar, em Ordem e Progresso.