domingo, abril 04, 2004

Não me digam "Boas Festas"



Não, não vivo de brincar!
Não, não brinco de viver!
Não, não me seduzem bolas douradas
Penduradas em árvores condenadas!
Lembram-me a fome na guerra.
Lembram-se milhares de crianças
Sem remédios, comida nem roupa.
Lembram-me feridas abertas pelas balas,
Os corpos explodidos pelas bombas.
Não, não me ofereçam prendas!
Ofereçam-me soluções genuínas.
Ofereçam-me antes caminhos
Que me não levem retrocedendo
Com os meus irmãos de berço.
Não quero festas, estou de luto!
Meu coração jaz em pranto;
Olho e estremeço de medo.
Não por mim, que habituada
Ao negrume desta vida
Vejo perto o fim da estrada
Mas por quanto é vindouro
E nada posso, nem deixo
Que prevista o seu destino
Ser bem melhor do que o nosso.
Sinto-me culpada enquanto
Parte indivisa do todo,
Ergo minha voz bem alto,
Mas soa frágil meu canto!
Canto, mesmo se chorando
Por todos os Natais que passo
Sem alegria... mas canto!
Porque o Menino nasceu
E a sua vida ofereceu
E à morte se entregou
Pelo inverso disto tudo:
Tanto fausto e tanto luxo!
Não, não me falem de festas,
Soam falso, brilham tanto
Como brilham altas as chamas
Verdadeiras, em que queimam
As nossas vidas goradas.
Dêem-me um Natal de esperanças!
Dêem-me Natais sem guerras!
Não me digam: boas festas...
Quais festas, se estamos todos
Beirando a orla do abismo?!
Ainda a tempo de evitá-lo
Mas para isso, há que olhá-lo,
E não passar distraído,
Olhando o desfilar lindo
De tanto, e tão falso brilho!

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